Cheguei cedo. Estava curiosa para saber mais sobre o Bold by Veuve Clicquot. O projeto, criado pela casa de champagne, tem como missão: “gerar maior inclusão, impacto e visibilidade para líderes empreendedoras femininas”. Também não queria perder a oportunidade de conhecer Catherine Petit. A trajetória da diretora-geral da Moët Henessy no Brasil havia chamado minha atenção. Muito menos queria perder o almoço harmonizado com Veuve Clicquot preparado pela anfitriã Claudia Krauspenhar, chef e proprietária do K.Sa. Ao entrar no restaurante estranhei que não havia ninguém do pequeno grupo convidado, descobri a razão: faltava meia hora para o início do evento. A empresária de sucesso Cintia Peixoto, que mediaria o bate-papo com três mulheres empreendedoras, foi quem me recebeu com o carinho de sempre. Ter me antecipado garantiu alguns minutos de conversa também com Petit. O que chamo sorte do acaso. E é tanto assunto que não sei por onde começar.

Primeiro falo da iniciativa Moët Henessy que está presente em dezenas de países pelo mundo, e há mais de 50 anos atua encorajando e inspirando líderes de sucessivas gerações de mulheres em diversas áreas de trabalho. No Brasil, Bold – ousadia em português – foi lançado em 2022 em um novo formato apresentado em encontros em São Paulo, Salvador e Rio de Janeiro. No final de novembro chegou a Curitiba.

Exemplo

Bold by Veuve Clicquot dá continuidade ao trabalho da viúva Clicquot, Nicole Barbe Clicquot Ponsardin, que aos 27 anos tornou-se uma das primeiras empresárias ao assumir a casa em 1805, em uma época em que as mulheres não podiam trabalhar ou votar. Além de expandir os negócios, criou o champanhe rosé e fez inovações que revolucionaram a forma de elaboração da bebida, introduziu a técnica do remouage que consiste em girar a garrafa para descolar os resíduos da fermentação e levá-los para o gargalo a fim de tirá-los.

O Bold  foi criado porque a Maison Veuve Clicquot quer dar uma real contribuição social às mulheres. Inicialmente, destacou o trabalho de executivas. Petit contou que a ideia evoluiu, passou a ser uma plataforma global mais abrangente. “Hoje, a Bold é inclusiva. É uma comunidade que compartilha experiências e espera quebrar paradigmas”. Quando Petit chegou ao Brasil pela segunda vez, já havia morado aqui antes, ela criou o “barômetro”, uma pesquisa realizada em várias cidades do Brasil e categorias sociais diferentes, entre homens e mulheres, para saber como estava o empreendedorismo no país, quem empreende, por quanto tempo, e perguntas qualitativas como: o que freia a mulher, quais são os medos e o que inspira. Com o resultado foi possível montar palestras que a empresa promove abordando, por exemplo, temas como barreiras mentais, medos e dificuldades comuns, entre outros assuntos importantes para refletir e tentar reverter o quadro: mulheres ainda são menos de 10% em cargos de liderança nas empresas.

Com os eventos, Petit quer dar acesso para mulheres de todas as classes formando uma rede que possa ajudar aquelas que não têm tantas oportunidades. “Vemos que funciona, que inspira, é muito bonito”, diz Petit emocionada com alguns resultados, como a empreendedora de uma comunidade no Rio de Janeiro, com quem ela manteve contato depois de uma das reuniões do projeto. No site https://www.boldopendatabase.com/en é possível acessar o banco de dados com informações para empreendedoras e uma relação de novos projetos e produtos. Petit, que costumava ser discreta e não falar da sua vida pessoal, mudou quando provocada a vencer a timidez. “Falar sobre as minhas dificuldades foi libertador e depois quando vi que meu exemplo poderia incentivar outras mulheres tive certeza da importância em compartilhar as minhas experiências e formar uma rede”.

Almoço

A organização de Curitiba selecionou três mulheres empreendedoras para o encontro: Tatiana Schuchovsky Reichmann, Luanna Toniolo e Claudia Krauspenhar, com histórias diferentes, e recebeu uma versão menor do evento, sem a participação de representantes de organizações sociais.

Tatiana Schuchovsky Reichmann é administradora e especialista em gestão de empresas, com mais de 25 anos de atuação junto ao consórcio Ademicon, a maior administradora independente de consórcio do Brasil em créditos ativos. Ela contou que aos poucos foi levando inovações para a empresa familiar e hoje coordena uma equipe de mais de 300 funcionários. Falou com entusiasmo e aprovação da mãe, que estava entre as convidadas, sobre como tocou a sua carreira. “Somos 60% de mulheres e crescemos juntas”, contou. Reichmann disse que o maior desafio é ser mãe e trabalhar. Um dos motivos do seu sucesso foi que aprendeu a se colocar no lugar do outro. Transformar vidas é o seu objetivo.

Luanna Toniolo, cofundadora e presidente da Troc, plataforma de moda circular, hoje parte do Grupo Arezzo&Co, foi eleita pela Bloomberg uma das pessoas mais influentes da América Latina. Ela contou como foi a mudança de rumo na sua carreira quando ainda estudante no exterior achou que precisava cuidar do meio ambiente. A questão da sustentabilidade foi decisiva para a ideia de criar a empresa. Depois de advogar por cinco anos, quando estava cursando Marketing em Harvard, viu crescer a vontade de pensar nas necessidades da sociedade e descobriu a sustentabilidade. Ela também queria deixar um legado. Foi assim que mudou sua carreira profissional rapidamente com o objetivo de trabalhar com moda de uma maneira diferente entrando na economia circular. Era 2015 e ela estava grávida quando abriu a Troc. “Não existiu um dia em que eu não acreditei no meu trabalho. Vale a pena ter um sonho grande e respeitar a intuição”, contou. Mas foi preciso vencer muitos desafios. A “menininha da moda” abriu um brechó e acordou cedo todos os dias para construir uma história de valor. A Troc tem a idade da sua filha e Luana acredita que as mulheres deveriam se ajudar mais.

Claudia Krauspenhar é advogada por formação e pós-graduada em Gestão da Gastronomia. No início da carreira, em 2008, foi eleita Chef Revelação pela Veja Curitiba. Depois de um tempo afastada da área, voltou ao mercado da gastronomia comprando um restaurante. Inaugurado em 2019, o K.sa foi eleito o melhor restaurante da região Sul pelo prêmio da revista Prazeres da Mesa Melhores da Gastronomia em 2023. A chef tem feito alguns pratos em jantares diferentes do seu dia a dia quando convida chefs de outros estados para cozinhar aqui que podem entrar para uma lista de especiais, são icônicos. Isso seria comprovado mais tarde no almoço quando as apresentações terminaram, desde a ostra com espuma de leite de coco e mel de abelha nativa, o carpaccio de vieira até o surpreendente rigatoni com camarão carabineiro e ovas. Testemunhamos o talento de Claudinha, como é chamada. Ela sempre soube que teria que lutar para alcançar a independência e ser uma mulher livre. Brinca que nunca sonhou em ser mãe e que ganhou 20 filhos no restaurante. Trabalha para que entendam a beleza de servir. “É preciso honrar as nossas escolhas. O desafio é diário e quero impactar mais mulheres”. A chef acredita que a gastronomia é um veículo de transformação. E deu uma dica para ser feliz: “Tenho uma rede de proteção com amigas e se não estamos satisfeitos precisamos mudar. Eu continuo sonhando e aprendendo”.

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