Acho que ainda não escrevi sobre o Alberto Landgraf, o chef paranaense que brilha em São Paulo, e o seu Epice, aberto em 2011, fora algumas linhas aqui e ali. Ando mais desligada do que o habitual, logo usarei a desculpa da idade, imagino. Porém o sabor da sua comida está ainda na minha memória, intacta. Sei que depois de “com-provar” o que os prêmios recebidos pelo jovem prometiam – foram quase 20 em dois anos -, convidei-o para uma palestra aqui em Curitiba. Queria ainda que ele cozinhasse com um chef daqui. Ele também está na lista do 50Best América e ganhou recentemente uma estrela Michelin, vale ressaltar.
Voltei ao seu restaurante semana retrasada. Hoje, após quase 10 anos de comilanças sem freios, apesar de ver minha poupança abaixar, sei que é preciso dar pelo menos duas a três chances para um lugar, seja para tentar refazer uma má impressão ou comprovar se é bom mesmo. Às vezes, descobrimos na segunda visita que não era o sabor da comida que nos impressionou, mas a novidade, a surpresa, ou qualquer outra coisa. De qualquer forma, depois de três visitas, sem convites, como simples cliente, o julgamento será mais fidedigno, e teremos menos chance de cometer uma injustiça. Pois, o Landgraf ainda me surpreende. É um chef determinado, exigente e criativo. Valoriza os melhores ingredientes – tem a relação dos fornecedores no site do restaurante, um bom exemplo -, usa muita técnica, porém, apresenta o resultado de uma forma simples. Não se engane, tem muito trabalho de pesquisa por trás de cada prato. Veja o menu degustado.
A sardinha com brioche e foie gras, a cebola assada com uni (ova de ouriço) e coisas simples, como o rabanete, são cartões de visita. Daria para comer um balde. Os suspiros vinham também da mesa ao lado que pediu o mesmo menu degustação, escutamos – as mesas são grudadinhas. O restaurante ainda serve pratos a la carte, mas o chef disse que em breve deixarão de existir.
Admiro o trabalho com fermentação que Landgraf faz, acho que é um caminho que nossos chefs deveriam explorar mais, apesar de o peixe com pêra ter carecido de um sabor mais pronunciado ou algo crocante para equilibrar, arrisco dizer. Estou com o meu exemplar do “A Arte da Fermentação”, do Sandor Katz, Editora Tapioca, ainda intacto, mas morta de curiosidade e, vou confessar, talvez com medo. Michael Pollan assina o prefácio e convida a todos a se abrirem ao, quase desconhecido da maioria, “mundo invisível dos fungos e bactérias”. Resumindo: pode continuar criando pratos originais. Queremos mais sabor e mais experiências alimentares.
Achei um desperdício e ao mesmo tempo uma genialidade a “folha” de vieira de sabor pronunciado, na foto abaixo. Um verdadeiro chef deve nos tirar da zona de conforto, penso. Às vezes, queremos o velho sabor conhecido. Acho que digo tudo isso porque amo a textura da vieira. Mas o prato é surpreendente.
Dedicado ao extremo, ele sabe explorar suas habilidades. Seu restaurante é despretensioso e acolhedor; os drinks do pequeno bar são bem feitos e o maître “se vira nos trinta” atento a tudo. É famoso o menu executivo da casa, que eu ainda não conheço. Todos mantém a forma descendo e subindo a pequena escada que leva até a cozinha. O projeto do pequeno restaurante de 30 lugares é do competente arquiteto Marcelo Ferraz.
E nem falei do coração e do peito de pato, da lula, da mandioquinha e das cenouras, que são especiais.
O sorvete de castanha é uma poesia até visual, só que fiquei querendo um chocolate ou alguma coisa mais familiar ao final, além da emulsão de mandioca com limão e garapa, e nem sou contra essa onda das sobremesas salgadas assim. Colocando as fotos aqui, vejo que algumas ficaram meio escuras, minha falha. Ao vivo os pratos tinham muito mais luz. Deu vontade de voltar.
Epice
Rua Haddock Lobo, 1002
São Paulo
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